A ameaça de chuva de ontem, que desmobilizou alguns, trouxe-nos à memória uma crónica publicada no extinto jornal "O Algarve", num passado longínquo e depois de uma enorme chuvada acompanhada de gigantesca trovoada que deixou os corredores/marchantes feitos "num oito" e que é agora oportuno recordar:
A ARCA DE NOÉ REVISITADA
Em tempos muito remotos o mundo, tal como hoje, era um coito de gentinha criminosa e
corrupta. Deus decide, depois de muito matutar e auscultar os seus
conselheiros, libertar o mundo dessa camarilha, poupando somente o único homem
bom que o habitava : Noé.
Ordena-lhe, em segredo, que construa uma gigantesca Arca, que albergue nela toda a sua família, e um
casal de cada espécie animal existente na Terra.
Deus, então, abre as torneiras do céu e inunda toda a Terra,
afogando todo o ser vivo que não teve a sorte de ser seleccionado como
passageiro da Arca. Enfim, uma discriminação muito criticada pelos partidos
políticos da oposição, sempre no contra, cujos líderes, devido a uma fuga de
informação, muito habitual naqueles tempos, tiveram conhecimento, em tempo, do
que se preparava e se refugiaram, quais ratazanas, clandestinamente, no esconso
porão da Arca. Tal como hoje, os chefes
salvam a pele e o povinho é que se trama.
Depois de meses de navegação errática (com tanta chuva o GPS
avariou), a Arca encalhou em solo firme. E os sobreviventes deram origem aos
povos que hoje conhecemos. A família de Noé reproduziu-se e hoje constituem o
limitado nicho de população honesta, pura, sem mácula. São poucos, mas
resistentes à luxúria que os cerca. Os outros, os clandestinos da Arca, deram
origem à malandragem que pulula por todo o lado. São os actuais corruptos,
criminosos e devassos.
Foi uma primeira tentativa falhada e ingénua de Deus, nessa
sua intenção de limpar a corrupção que grassava no mundo.
Recentemente tivemos acesso ao Facebook do Arcanjo Gabriel
(pertence ao nosso grupo de amigos) onde se especulava sobre o novo plano de
limpeza que está a ser congeminado por Deus: um novo dilúvio. Segundo Gabriel,
Deus reuniu com o seu conselho de estado, e há uma fortíssima corrente de
opinião a favor do extermínio da actual, corrupta, humanidade. Os únicos
conselheiros contra tal desiderato são a Madre Teresa de Calcutá e João Paulo
II, de enorme bondade, muito próximos de Deus, e com muita influência nas suas
decisões. No entanto, um grupo da oposição, muito coeso exige uma actuação
rápida. Hitler aconselha o uso de gás letal. Nero, antigo imperador romano,
propõe que se atei fogo a todo o planeta, transformando os seres humanos em feéricas
tochas. Sabe-se que encomendou uma harpa através do conhecido “site”
www.harpasdodemo.com, e está a compor um salmo, para entoar enquanto o incêndio
perdurar. Judas, apesar da sua pouca influência junto de Deus, sugere o
extermínio total, mas, sempre materialista, exige a preservação de todas as
riquezas existentes.
Perante estas opiniões tão antagónicas, Deus está dividido.
Infinitamente bom, não quer desgostar ninguém. E resolve, depois de muito
meditar, e de muitas pesquisas na net, reeditar uma segunda versão do dilúvio
universal, a aplicar em data a combinar. E resolve, contentando todos, testar
os efeitos, na humanidade, de mini dilúvios em zonas previamente seleccionadas.
Uma dessas experiências decorreu na zona de Conceição e
Cabanas, no concelho de Tavira, às 10 horas da manhã do dia 8 de Dezembro, e
coincidiu com a marcha programada para esse dia, apanhando desprevenidos alguns
de nós, heróicos marchantes.
A experiência divina foi um sucesso estrondoso, e um
extraordinário ensaio para o apoteótico dilúvio final. Os relâmpagos, os
trovões, sucediam-se para gáudio de Nero, o cheiro a enxofre contentava Hitler.
A água jorrava em catadupa. As ruas de Cabanas transformadas em caudaloso rio,
desapareceram. Os marchantes, indómitos, enfrentavam corajosamente a formidável
experiência de Deus. A água subia pelos artelhos, pela canela, até aos joelhos,
enquanto o fogo crepitava sobre as suas cabeças. A harpa de Nero ressoava nos
seus fustigados ouvidos. O João Carmo, o Zé Maria, o Tinoco, o Pacheco, quais ciclopes,
arrostavam com os ventos, as águas, o fogo.
E aos 30 minutos Deus
descansou. A experiência tinha sido um sucesso. Hitler e Nero salivavam na
expectativa do dia do juízo final, que anseiam cada vez mais perto. Madre
Teresa e João Paulo, aliviados, agradeciam a contenção divina.
E nós, marchantes, no âmago da acção, protagonistas da
experiência, ficámos com uma história para contar. E logo ali, os sobreviventes
do apocalipse, constituíram-se em grupo de pressão e de apoio massivo em
futuras eleições, ao PSH (Partido da Salvação da Humanidade) da Teresa e João
Paulo, contra o PDH (Partido da Destruição da Humanidade) de Hitler e Nero.
Juntem-se a nós e votemos em massa na preservação da espécie humana e
manifestemo-nos domingo a domingo, nas nossas marchas, contra este tipo de
experiências divinas. Marchantes unidos, jamais serão vencidos!
Jorge Lopes
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