quinta-feira, 26 de março de 2020

A COVID-19 E UM EXEMPLO DE SACRIFÍCIO E CORAGEM

COVID-19 também nos inferniza a vida, mas façamos como o Pacheco e olhemos para ela como um inimigo a quem daremos luta e que iremos vencer certamente. FIQUEM EM CASA. 

UM EXEMPLO DE CORAGEM 
Por vezes encaramos os nossos pequenos problemas, as nossas dores, as nossas mazelas, como se o mundo girasse à nossa volta. Exigimos compreensão e solidariedade projectando nos outros as nossas dificuldades, como se deles fossem.
Há pessoas, contudo, que pela sua coragem, resistência à adversidade e amor à vida devem servir-nos de exemplo, ajudando-nos a reduzir à sua verdadeira dimensão, as pequenas preocupações do nosso dia a dia.
Vem este arrazoado pseudo-moralista, que peço me desculpem, a propósito de uma doença que assusta todos mas que alguns enfrentam com coragem e determinação: o cancro.
Dirão vocês agora: “Que raio, vem este tipo, no âmbito de uma página dedicada à alegria que emana das marchas, falar-nos de coisas que, apesar de reais, nos entristecem”. Não me levem a mal, mas por favor, leiam até ao fim e perceberão o porquê deste tema.
Sabemos de casos de cancro de pessoas famosas, que chegaram ao nosso conhecimento através dos meios de comunicação social, como exemplos de força psicológica e coragem no combate à doença que os atingiu. Um dos mais conhecidos é o do extraordinário ciclista Lance Armstrong que, no início de uma promissora carreira no ciclismo, descobriu que tinha um cancro num testículo, um tumor num pulmão e outro no cérebro. Lance, ao ver o mundo a desabar-lhe em cima, não se deixa abater e numa entrevista diz: “Enganaste-te na pessoa ao escolheres um corpo para viver, cometeste um erro porque escolheste o meu”, demonstrando que, na batalha contra aquele inimigo, não havia lugar a tréguas. E Lance venceu a batalha. Depois da cura venceu por 7 vezes a volta à França, transformando-se no maior ciclista de todos os tempos. 
No nosso país todos sabemos a luta que, actualmente, trava o actor António Feio que resolveu tornar pública a sua luta contra um cancro no pâncreas. Com firmeza e uma extraordinária serenidade, resolveu enfrentá-lo na esperança de o vencer. Em entrevista televisiva recente, revelou-nos uma calma, um apego à vida, uma determinação que comove e nos leva a dar-lhe todo o nosso apoio moral e a desejar-lhe que vença, para que continuemos a maravilhar-nos com a sua presença na TV e nos palcos deste país.
Mas exemplos de grande coragem e força psicológica, que não chegam aos jornais por se tratar de gente anónima, há por aí muitos. No nosso pelotão de marchantes há, pelo menos, um caso que merece ser divulgado. Revelando uma superioridade moral, que me esmagou, o Pacheco autorizou-me a revelar o seu caso pessoal que equiparo ao do ciclista Lance Armstrong. Um ligeiro sinal nas costas, a que não ligou de início, evoluiu para um melanoma que lhe transformou a vida. Tudo ruiu à sua volta. Abdica da sua, até aquela altura, brilhante carreira profissional e dedica-se a um combate cujas probabilidades de sair vencedor eram diminutas. Não sei qual a frase que o Pacheco disse no início da batalha, mas pelo que hoje conheço dele, quase aposto que seria algo semelhante ao que Lance Armstrong utilizou: ”Escolheste mal o corpo onde te alojaste, agora vais arrepender-te”.
Não vou contar, em pormenor, a dolorosa odisseia, de anos, que o Pacheco enfrentou. Mas dir-vos-ei que foram 5 operações ao melanoma inicial e a metástases que apareceram posteriormente. A 5ª operação foi adiada, pelas mais variadas razões, por 8 vezes. O Pacheco, cansado de esperar, interroga o médico sobre as razões de tais adiamentos. “É um local de difícil acesso, percentagem de sucesso diminuta, receio que corra mal, etc, etc” – diz-lhe o médico. E o Pacheco responde-lhe, encorajando-o: “Não tenha problema doutor, tudo vai correr bem”. O Pacheco cita-me este diálogo com simplicidade, com naturalidade, como se estivesse a pedir uma bica ao balcão de um café. Foi como se me tivesse atingido com um murro no estômago. Ele nem notou a comoção que me provocou. Aquela simples frase continha tudo, uma forma optimista de encarar a adversidade, o apego à vida, a força de um extraordinário carácter, a vontade de viver e uma calma que superava a do próprio médico. Aquela frase era um hino à vida, uma lição de coragem e um exemplo para todos nós.
Passados 18 anos desde a primeira operação, evidenciando uma saúde de ferro, marchante assíduo, enaltecendo sempre os benefícios que a prática da marcha lhe trouxe no combate à doença que o atingiu, o Pacheco, modestamente, como se o mérito não fosse dele, costuma dizer: “Lá em cima alguém estabeleceu uma moratória à minha vida”.
NOTA: Esta crónica foi escrita (em 2009) antes da morte do actor António Feio e da descoberta do doping de Lance Armstrong. Os exemplos dados não invalidam a finalidade com que foram citados, pelo que resolvemos manter a versão inicial. Falta acrescentar que o meu amigo Pacheco ainda nos dá o prazer de estar vivo e de boa saúde. Fica aqui um abraço bem forte.

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